Mestranda da UFG ganha prêmio internacional por projeto com células-tronco para substituir testes em animais
23/06/2024
Iniciativa oferece à indústria de cosméticos alternativa para identificar substâncias que possam causar malformações congênitas em bebês. Pesquisadora recebeu 10 mil libras esterlinas (quase R$ 69 mil). Mestranda da UFG ganha prêmio internacional por projeto para substituir testes em animais
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal de Goiás (UFG), Lauren Dalat foi premiada no Lush Prize 2024, em Londres. A pesquisadora apresentou um projeto que propõe a substituição de testes em animais na indústria de cosméticos por um modelo de testagem que usa células-tronco extraídas de dentes.
A pesquisa demonstrou que células-tronco dentárias podem ser usadas para identificar substâncias em cosméticos que possam causar malformações congênitas em bebês. Atualmente, a testagem é feita em animais ou em células extraídas de animais. No entanto, segundo a pesquisadora, os experimentos como são feitos atualmente podem não refletir com precisão a reação em humanos.
Para o Lush Prize, Lauren Dalat sugeriu uma plataforma para testar substâncias em cosméticos usando um modelo que combina pele humana 3D e células-tronco dentárias.
“Não acreditei quando fui pré-selecionada e fiquei ainda mais feliz quando recebemos esse reconhecimento. Além disso, é importante para reforçar a necessidade de criação de novas metodologias que não utilizem animais”, disse a pesquisadora ao g1.
A pesquisadora de 25 anos venceu na categoria Jovem Pesquisador e recebeu um prêmio de 10 mil libras esterlinas (quase R$ 69 mil). Segundo ela, o dinheiro será utilizado para dar continuidade à pesquisa, já que o modelo de testagem proposto ainda não está pronto para ser usado na indústria.
Pesquisa desenvolvida na UFG sugere alternativa para testes em animais - Goiás
Arquivo Pessoal/Lauren Dalat
Lauren contou que faz parte de um grupo de pesquisa que se dedica ao estudo de alternativas para testes com animais, sob orientação da professora Marize Campos Valadares, no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Toxicologia In Vitro da Faculdade de Farmácia da UFG (Tox In-FF/UFG). A partir do trabalho da equipe, os participantes desenvolveram diversos estudos na área.
"Sempre gostei muito de animais e atuei em diversas causas, então consegui unir o útil ao agradável. Minha colega sempre diz que consegui juntar o amor pelos animais com a pesquisa, que também é algo que eu sempre gostei", contou.
Lauren Dalat destacou que a alternativa de testagem com células-tronco dentárias propõe um método mais confiável e ético para testar cosméticos, garantindo a segurança dos consumidores sem recorrer ao uso de animais. “O principal problema dessa metodologia [teste em animais], além de ser eticamente questionável, é o fato de que pode haver variação entre as espécies, ou seja, a resposta do animal pode não ser igual à resposta humana”, explicou.
“É uma técnica cara e trabalhosa, e, além disso, utiliza um grande número de animais por experimento”, completou.
Regras para testagem em animais
Lauren Dalat e a orientadora na Universidade Federal de Goiás
Arquivo pessoal/Lauren Dalat
Lauren explicou que a Resolução nº 58, de 2023, proibiu o uso de animais vertebrados em pesquisa científica e no desenvolvimento de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes que já tenham ingredientes comprovadamente seguros e eficazes. Por isso, as indústrias necessitam de abordagens alternativas.
“Acredito que, aqui no laboratório, abordamos duas questões: o aspecto ético, porque não faz sentido submeter um animal a um ensaio com baixa predição, e a obtenção de respostas mais fidedignas usando linhagens celulares e cultivos primários de células humanas, em vez de animais”, ressaltou.
A pesquisadora explicou que os dentes e a pele utilizados no modelo de testagem sugerido podem ser obtidos por meio de doações voluntárias, de doadores saudáveis de 5 a 30 anos. A pele, por exemplo, pode ser doada após remoção cirúrgica do excesso de pele.
Tragédia da Talidomida
A pesquisadora contou que, em meados da década de 1960, houve uma tragédia relacionada ao uso de um medicamento chamado talidomida, que foi amplamente prescrito para combater náuseas em mulheres grávidas em todo o mundo. Posteriormente, descobriu-se que o remédio era responsável por um grande número de malformações congênitas.
Lauren Dalat explicou que ensaios pré-clínicos em animais não mostraram efeitos teratogênicos (capacidade de causar malformações no feto) do remédio.
"No entanto, uma vez metabolizada no corpo humano, ocorria a formação do isômero S, que apresentava essa propriedade teratogênica. Isso resultou nos casos de focomelia em bebês expostos à talidomida, onde ocorria a ausência de membros superiores ou inferiores", explicou.
Lauren defende que a testagem em tecido de pele humana 3D com derivados de células-tronco dentárias permite avaliar os efeitos de forma mais realista. A pesquisadora destacou ainda que a metodologia padrão atual para detectar o potencial teratogênico envolve, em média, 1 mil animais por experimento.
Já no modelo proposto, é possível cultivar várias garrafas de células-tronco a partir de uma única amostra. "A partir de um dente, é possível extrair células-tronco da papila, do ligamento e da polpa. Como extraímos essas células dos explantes (fragmentos do tecido), é possível cultivar várias garrafas a partir de uma única amostra", explicou.
Lush Prize
Lauren Dalat ganha prêmio em Londres
Arquivo Pessoal/Lauren Dalat
O Lush Prize oferece um fundo global para apoiar iniciativas que visam acabar ou substituir os testes em animais. O prêmio abrange cinco categorias principais: Ciência, Educação, Conscientização Pública, Lobbying e Jovem Pesquisador/a. Além disso, há três prêmios de reconhecimento especial: Colaboração Científica Importante, Realização Política e o Prêmio Andrew Tyler, por contribuições excepcionais para a erradicação dos testes em animais.
Em 2024, Lauren Dalat foi a única pesquisadora brasileira e vencer em uma categoria. Ao todo, foram 14 projetos vencedores, de 9 países diferentes.
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